Telenovela da Globo testa vitalidade de terminação da palavra
Por Elis de Almeida Cardoso
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m português há muitos sufixos formadores de diminutivos, que expressam
diferentes valores afetivos. Nomes formados com diminutivos relacionam-se com a
ideia de carinho, delicadeza, ternura, humildade, mas também podem ser pejorativos
exprimindo depreciação, irritação,
ironia.
Principalmente na
linguagem coloquial, advérbios e pronomes com sufixos diminutivos podem ganhar
valor enfático (agorinha, nadinha). Unido a bases que têm traços semânticos de
delicadeza ou pequenez, o sufixo atua como intensificador (lindinho,
pequeninho). Já unido a bases cuja conotação é depreciativa, indica tolerância
e compreensão (feinho, bobinho). Pode até perder seus traços semânticos em
formações com outros sentidos (camisinha).
Dos sufixos
diminutivos mais comuns, além de –inho/-zinho, há –eta (caderneta,
lingueta), -ito (livreto), -ola (sacola), -ete (disquete). O mais produtivo
é mesmo a
dupla –inho/-zinho, mas o sufixo –ete vem
ganhando, na língua falada, na internet e nos programas de TV, uma frequência
bem alta, por seu valor expressivo.
Mesmo usado em
palavras dicionarizadas (ver quadro), novas palavras com essa terminação surgem
a cada dia. O valor de diminutivo desaparece e outros sentidos passam a ser
vistos em palavras com –ete. Desde a era das “chacretes”, não se via uso
tão exagerado do sufixo.
Programas de TV
seguiram a mesma linha de Chacrinha. “Boletes” eram as moças do Clube do Bolinha
(Bandeirantes, anos 80). Hoje, as “paniquetes” (ou panicats) são as que recebem
closes das câmeras no Pânico na Band. E as “calderetes” povoam o Calderão do
Huck (Globo). O –ete continua usado em referência às mulheres. Antes
eram chamadas de “vedetes” e “coquetes”, palavras vindas do francês. Hoje,
ouvem-se as formações “reboletes”, “fanketes”,
”periguetes”. É a terminação –ete em novas palavras.
Periguete
Quem são, afinal,
as periguetes (ou piriguetes)? Representadas nas novelas da Globo Insensato
Coração (2011), por Deborah Secco (Natalie); Fina Estampa (2011/2012), por
Carolina Dieckman (Teodora), e Avenida Brasil ( no ar) por Ísis Valverde
(Suellen) são mulheres que usam roupas justíssimas e chamativas, sempre em cima
de um salto, muito maquiadas, com bijuterias enormes e o único objetivo de
chamar a atenção, conquistar.
São mais do que
um perigo... sempre prontas para seduzir. Nas baladas, escolhem com quem querem
ficar e ficam. Formada por “perigo” + -ete, a palavra é usada com
conotação diferente do adjetivo “perigosa” e circula há anos. Já foi usada pela
cantora Ivete Sangalo, que em show deixou de ser Ivete para ser “Periguete”. O
funk Piriguete de MC Papo tem como refrão:
Quando ela me vê ela mexe
Quando ela me vê ela mexe
Piri, Pipiri, Pipiri, Piri, Piriguete
Rebola devagar depois desce
Piri, Pipiri, Pipiri, Piri, Piriguete
As periguetes que
vão a bailes funk são conhecidas como “funketes”. Quando na balada, podem ser
chamadas de “reboletes” e acabam sempre arrumando um “peguete”. O substantivo “rebolete”
retoma a ideia da dançarina “peguete”, comum de dois gêneros, é a pessoa que se
está “pegando”, “ficando”... com quem se mantém relação sexual ou afetiva
ocasional, sem compromissos.
Nas novelas que
retratam o universo carioca circulam agora as “empreguetes”. Cheias de Charme
(Globo, no ar) mostra domésticas que querem ser alçadas ao sucesso. Cida
(Isabelle Drummond), Penha (Taís Araújo) e Rosário (Leandra Leal) se dizem “empreguetes”
e produzem um videoclipe cujo título é Vida de Empreguete. “Empreguete é a
empregada jovem que quer ser reconhecida pelo seu sucesso e chegar à condição
de patroa.
O sufixo –ete
tem, no caso, valor carinhoso. Amigas tratam-se, sobretudo na adolescência, por
“amiguetes”. O –ete pode pode ter valor de feminino, quando as calouras
que acabam de ingressar no ensino universitário são chamados de “bixetes” (pois
“calouro” é “bixo”). Formando o feminino, o sufixo continua afetivo.
Fanzetes
Desde que o
jogador Neymar atingiu fama e popularidade, uma legião de fãs o segue. Dentre seus admiradores, há um grupo especial:
as “neymarzetes”. Seguidoras do jogador no Twitter, santistas por causa do
craque, as neymarzetes (mais sonoro do que “neymaretes”) vão a estádios, levam
cartazes, gritam e fazem de tudo para ter uma foto do ou com o ídolo.
Fazem coro com as
“luanetes”, dessa vez as seguidoras do cantor Luan Santana, outro fenômeno, não
do futebol, mas do meio musical-sertanejo. Essas torcedoras especiais, essas
jovens enlouquecidamente apaixonadas são as responsáveis por essa outra
conotação do sufixo. O –ete passa a designar também a fã de alguém.
A terminação, com
/e/ aberto, é sonora e seu valor semântico nas formações novas e não
dicionarizadas revela expressividade porque vai do pejorativo ao afetivo.
Formar palavra com
–ete é, pois, uma tendência,
modismo que faz com que o sufixo ganhe seu minuto de fama.
A diversidade de usos tradicionais e já dicionarizados do sufixo –ete
O sufixo –ete,
pelo Houaiss, manifesta-se em “diminutivos, diminutivos afetivos e diminutivos
designativos de outra coisa”, encontrado em palavras como: artiguete, bracelete,
cavalete, farolete, mulatete, olhe-te, palacete. Algumas trazem variação no
timbre do /e/ tônico, pronunciado ê ou é.
Nem sempre tem
valor diminutivo ou é considerado sufixo: “gilete” vem de nome próprio
(Gillette) usado metonimicamente (marca pelo produto) como “lâmina de barbear”
e, depois, metaforicamente (motorista barbeiro; indivíduo bissexual).
No Brasil, o –ete,
agora com /e/ aberto, surge quando se deseja um toque de modernidade, associado
ao picaresco (“jambete”, mulata cor de jambo) ou para dar atrativo a produtos.
Quem se lembra da boneca “Fofolete”? O /l/ é consoante de ligação (fofo + -ete).
Fonte: Revista Língua/julho de 2012
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