De
autoria da leitora Dinéia Hypolitto, o texto versa sobre a importância da
formação continuada e suas repercussões para os profissionais.
A
formação contínua (2) é (Nóvoa 1991, Freire 1991 e Mello 1994) saída
possível para a melhoria da qualidade do ensino, dentro do contexto educacional
contemporâneo. Nova o bastante para não dispor ainda de mais teorias
nutrientes, provavelmente, ainda em gestação. É uma tentativa de resgatar a
figura do mestre, tão carente do respeito devido a sua profissão, tão
desgastada em nossos dias. "Ninguém nasce educador ou marcado para ser
educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador,
permanentemente, na prática e na reflexão da prática". (FREIRE, 1991: 58).
Para
o autor, formação permanente é uma conquista da maturidade, da
consciência do ser. Quando a reflexão permear a prática, docente e de vida,
a formação continuada será exigência "sine qua non" para
que o homem se mantenha vivo, energizado, atuante no seu espaço histórico,
crescendo no saber e na responsabilidade.
A
modernidade exige mudanças, adaptações, atualização e aperfeiçoamento. Quem não
se atualiza fica para trás. A parceria, a globalização, a informática, toda a
tecnologia moderna é um desafio a quem se formou há vinte ou trinta anos. A
concepção moderna de educador exige "uma sólida formação científica,
técnica e política, viabilizadora de uma prática pedagógica crítica e
consciente da necessidade de mudanças na sociedade brasileira"
(Brzezinski, 1992:83).
O
profissional consciente sabe que sua formação não termina na Universidade. Esta
lhe aponta caminhos, fornece conceitos e ideias, a matéria-prima de sua
especialidade. O resto é por sua conta. Muitos professores, mesmo tendo sido
assíduos, estudiosos e brilhantes, tiveram de aprender na prática, estudando,
pesquisando, observando, errando muitas vezes, até chegarem ao profissional
competente que hoje são.
A
Universidade não é o que deveria ser: um centro de criação do conhecimento, de
pesquisa e questionamento. O universitário continua passivo, esperando o
"ponto" do professor, memorizando e repetindo na prova, que decide a
sua aprovação. Vasconcellos (1995:19) confirma:
Formação
deficitária; dificuldade em articular teoria e prática: a teoria de que dispõe,
de modo geral, é abstrata, desvinculada da prática e, por sua vez a abordagem
que faz da prática é superficial, imediatista não crítica.
A
Universidade também não é nacional nem universal. Não se comunica com a
sociedade, não conhece o mundo empresarial e do trabalho, não contribui nem
aproveita contribuições de outros setores. Não é universal: desconhece ou não
aproveita a evolução e mudanças do mundo da ciência e da tecnologia. Está
isolada, repetindo um currículo defasado, inócuo, desinteressante e fechado.
O
professor, nela formado, deve ter bastante inteligência, tempo e decisão para
superar essas deficiências. Por si mesmo, deve procurar atualizar-se,
embasar-se teoricamente, observar a prática e tirar lições melhorar seu
desempenho.
Um
professor destituído de pesquisa, incapaz de elaboração própria é figura
ultrapassada, uma espécie de sobra que reproduz sobras. Uma instituição
universitária que não sinaliza, desenha e provoca o futuro encalhou no passado
(DEMO, 1994:27).
O
professor repete o mesmo currículo de seus antecessores e, assim, a escola
continua parada no tempo com alunos indisciplinados e desmotivados, passando conhecimentos
que em nada servem para a vida social, profissional e pessoal.
Que
deve fazer o professor consciente e comprometido com seu trabalho? Investir em
sua formação, continuá-la para não frustrar-se profissionalmente, para poder
exigir respeito e, mesmo, melhorias salariais.
O
dia cheio e estafante não reserva tempo para a leitura, o estudo, a preparação
de aula. Os cursos propostos, geralmente aos sábados ou em horários
impossíveis, não atraem o professor que, ao menos, nos fins de semana, quer ficar
com a família e muitas vezes com os cadernos e provas para corrigir.
Entretanto,
"o profissional do futuro (e o futuro já começou) terá como principal
tarefa aprender. Sim, pois, para executar tarefas repetitivas existirão os
computadores e os robôs. Ao homem competirá ser criativo, imaginativo e
inovador" (Seabra, 1994:78).
Diante
desse quadro, não é utopia desejar uma escola de ensino fundamental e médio com
equidade, que ofereça bom ensino, que prepare para os desafios da modernidade?
O
professor sai da universidade apenas com um diploma. Não está preparado para
ensinar, não domina o conteúdo, não conhece metodologias eficazes, falta-lhe
estímulo para enfrentar uma classe agitada, indisciplinada, apática e passiva.
A
oferta de vagas, pelo menos na rede pública estadual de São Paulo, aumentou, e
atende a quase toda a demanda. A muitas escolas está chegando a tecnologia: TV,
vídeo, computador. A burocratização cede um pouco e confia à Diretoria Regional
de Ensino autonomia para dirigir suas escolas. Estas recebem verbas e podem
aplicá-las conforme suas necessidades.
Entretanto,
apesar dessas melhorias, muitas dessas conquistas do professorado, a escola não
avança, o nível de ensino continua precário, a desmotivação de professores e
alunos atinge o grau máximo.
Não
acreditamos que a solução esteja tão somente na justa remuneração do professor.
Ela tem que envolver outros setores e de modo global e profundo. A escola está
à margem da sociedade, não dispõe dos atrativos da mídia: esportes, brinquedos,
diversões. O professor, sem base sólida cultural e específica, não tem
descortino e firmeza para construir com o aluno o conhecimento. Ambos pararam
no tempo.
Alonso desenha o perfil
do novo profissional:
Torna-se
um profissional efetivo, em contraposição ao tarefeiro ou funcionário
burocrático; Esse profissional terá que ser visto como alguém que não está
pronto, acabado, mas em constante formação; Um profissional independente com
autonomia para decidir sobre o seu trabalho e suas necessidades; Alguém que
está sempre em busca de novas respostas, novos encaminhamentos para seu
trabalho e não simplesmente um cumpridor de tarefas e executor mecânico de
ordens superiores e, finalmente, alguém que tem seus olhos para o futuro e não
para o passado. (1994:6).
Como
formar (ou reformar) o formador para a modernidade? Através de uma formação
continuada, que, além de reforçar ou proporcionar os fundamentos e
conhecimentos de sua disciplina, o mantenha constantemente a par dos
progressos, inovações e exigências dos tempos modernos.
Esteves (1993:66)
aponta algumas características da formação continuada:
Uma
ruptura com o individualismo pedagógico, ou seja, em que o trabalho e a
reflexão em equipe se tornam necessários; uma análise científica da prática,
permitindo desenvolver, com uma formação de nível elevado, um estatuto
profissional; um profissionalismo aberto, isto é, em que o acto de ensino é
precedido de uma pesquisa de informações e de um diálogo entre os parceiros
interessados.
Como
e quando realizar a formação continuada? Nos fins de semana? É impraticável e
não se pode exigir de quem trabalha a semana inteira e merece, como os outros
trabalhadores, descanso e lazer. Em serviço? Talvez. Isso implicaria em
alteração da rotina da escola: diminuição de dias letivos, dispensa de alunos e
outros acertos para obter a participação da maioria.
Tudo
isso envolve dinheiro e, sobretudo, vontade política. Não adianta construir e
reformar prédios, dotá-los de todos os recursos da tecnologia, se o seu líder,
o professor está desmotivado e despreparado para desencadear o processo.
"Não há ensino de qualidade, nem reforma educativa, nem inovação
pedagógica, sem uma adequada formação de professores". (Nóvoa, 1992:9).
Os
cursos de fim de semana não têm dado bons resultados. Na escola, durante o
serviço, não conseguem reunir a todos, pois muitos trabalham em outros locais.
Mesmo
supondo que o professor tenha recebido adequada formação, a atualização é uma
exigência da modernidade. Tabus caem, métodos são questionados, conceitos são
substituídos, o mundo da ciência, do trabalho, da política, da empresa caminha
velozmente para mudanças de padrões e exigências. Se o diploma abre as portas
do mercado de trabalho, não garante a permanência nele. Os medíocres, serão
preteridos pelos melhores classificados.
E
o profissional da escola? Aqui a situação é diferente e peculiar. Não há
cobrança nem supervisão. O professor excelente tem a mesma consideração,
avaliação que o omisso e incapaz. Não há estímulo para atualização e
aprimoramento. Os salários são baixos, a estrutura, precária, a aposentadoria,
aterrorizante. A própria comunidade não cobra bom desempenho do professor,
contentando-se apenas em que a escola aceite seus filhos para não ficarem sós
em casa ou na rua.
Não
há divulgação de experiências bem sucedidas entre os professores; um não sabe o
que o outro está "dando", os métodos e avaliação são pessoais e
arbitrários. Para Esteves (1993:98), a formação continuada exige profissionais
"conhecedores da realidade da escola, capazes de trabalhar em equipe e de
proporcionar meios para a troca de experiências, dotados de atitudes próprias
de profissionais cujo trabalho implica a relação com o outro...".
O
treinamento empresarial é geralmente realizado em serviço. Cursos são
ministrados ao final do expediente, a empresa abre mão de seus funcionários,
por acreditar que investir em sua formação continuada é lucro e retorno
garantidos. Algumas empresas, em locais especiais, durante uma semana ou mais
dias, capacitam os seus funcionários em um ambiente saudável que permite, além
da troca de experiências e interação, aperfeiçoar-se em seu serviço.
O
Estado é o maior empregador. Só que não dispõe (sic) de verba para imitar as
grandes empresas. Ou não tem vontade política para isso. Entretanto, segundo
Nóvoa (1992:27), "importa valorizar paradigmas de formação que promovam a
preparação de professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu
próprio desenvolvimento profissional e que participem como protagonista na
implementação das políticas educativas".
Voltamos
ao ponto inicial: ou se investe no professor, em sua formação, atualização e
satisfação pessoal e profissional, ou a escola continuará sendo a mentira que
é: de portas abertas, sim, porém, um pseudo-ensino, sem características de equidade,
ultrapassado, a serviço da manutenção do status quo, que é o que deseja a
classe dominante.
Masetto (1994:96)
aponta as características que deve possuir a formação do professor:
Inquietação,
curiosidade e pesquisa. O conhecimento não está acabado; exploração de
"seu" saber provindo da experiência através da pesquisa e reflexão
sobre a mesma; domínio de área específica e percepção do lugar desse
conhecimento específico num ambiente mais geral; superação da fragmentação do
conhecimento em direção ao holismo, ao inter-relacionamento dos saberes, a
interdisciplinaridade; identificação, exploração e respeito aos novos espaços
de conhecimento (telemática); domínio, valorização e uso dos novos recursos de
acesso ao conhecimento (informática); abertura para uma formação continuada.
Propostas
de solução só à longo prazo. Se a escola não começar a melhorar hoje, amanhã
ela continuará a ser o que é. O hoje significa o ensino fundamental. Se nossas
crianças não forem alfabetizadas adequadamente, não aprenderem a ler o livro e
o mundo, a questionar, criar, participar, exigir; se os métodos não se tornarem
ativos, se o conteúdo não se tornar significativo, de nada adianta falar em
reforma ou melhoria de ensino em outros níveis. A base é que está viciada e
precária. Estamos alfabetizando como há cinquenta anos: repetindo lições,
copiando a cartilha, falando uma linguagem incompreensível.
Enquanto
isso a criança se agita ou fica quieta. Não fala, só ouve: não pensa, só imita;
não constrói, recebe pronto. Se não se investir aqui, no começo, na base,
tornando a escola um espaço alegre de criação, descoberta, vivência e
solidariedade, trabalho conjunto em que o professor não é o mestre mas o
coordenador e organizador do trabalho, membro de uma equipe de pesquisa e
estudo..., a escola continuará na UTI. Não morrerá, pois isso não interessa ao
poder mas continuará agonizante, amorfa, inútil, reprodutora e servil à classe
dominante.
É
esse o desafio para os educadores: reformar desde as bases a escola e
prepará-la para a modernidade. Por quê? Porque como nos explicita NÓVOA
(1991:29)
Grande
parte do potencial cultural (e mesmo técnico e científico) das sociedades
contemporâneas está concentrado nas escolas. Não podemos continuar a
desprezá-lo e a menorizar as capacidades de desenvolvimento dos professores. O
projecto de uma autonomia profissional, exigente e responsável, pode recriar a profissão
professor e preparar um novo ciclo na história das escolas e dos seus
atores. (Nóvoa, 1991:29).
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(1) Dinéia
Hypolitto – Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação
e Currículo da PUC-SP; Professora de Prática de Ensino e Coordenadora de
Estágio da Universidade São Judas Tadeu (USJT) – SP; Supervisora aposentada da
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
(2) "Actividades
formativas que ocorrem após a certificação profissional inicial... que visam
principal ou exclusivamente melhorar os conhecimentos, as habilidades práticas
e as atitudes dos professores na busca de maior eficácia na educação dos
alunos". (RODRIGUES & ESTEVES, 1993: 44)
Referências
Bibliográficas
ALONSO, Myrtes. Uma
tentativa de redefinição do trabalho docente. São Paulo: 1994 (mimeo).
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